Documentos comprovam apoio brasileiro ao golpe militar no Chile
Na última imagem com vida, Allende (ao centro, com capacete e fuzil) aparece junto a assessores no Palácio de La Moneda sitiado, em 1973
Na última imagem com vida, Allende (ao centro, com capacete e fuzil) aparece junto a assessores no Palácio de La Antonio Candido da Câmara Canto sabia que uma conspiração militar para derrubar o então presidente do Chile, Salvador Allende, estouraria naquele setembro.
Há exatos 40 anos, tanques e caças bombardearam o Palácio de La Moneda, de onde Allende saiu morto. Foi o início da vitória do golpe que levou o general Augusto Pinochet ao poder. Era 11 de setembro de 1973.
Embaixador do Brasil no Chile desde 1968, hostil ao governo da coalizão esquerdista Unidade Popular e apreciador de cachimbos, ele frequentava os salões do elegante Club de la Unión, em Santiago. Também cavalgava na companhia de oficiais que orquestraram a queda de Allende.
No dia 8 de setembro, três dias antes do golpe, Câmara Canto vaticinou dias difíceis em telegrama para o Itamaraty: "A situação do Chile nunca esteve tão confusa e, ao mesmo tempo, tão crítica".
O alerta do diplomata consta em arquivos guardados no subsolo do Ministério das Relações Exteriores, em Brasília. Na véspera do envio do telegrama, ele recebera chefes das forças chilenas na festa de comemoração da Independência brasileira na embaixada. A reunião é considerada por historiadores como momento chave da conspiração.
Zero Hora vasculhou o acervo da correspondência entre o Itamaraty e a embaixada de Santiago de janeiro a dezembro de 1973. Nos documentos, Câmara Canto mostra nítida aversão pelo governo Allende. Termos como "milícias vermelhas" e "hordas marxistas" aparecem em meio a análises político-econômicas que anunciam "sombrias perspectivas para o Chile". Em telegrama de janeiro, ele define como "desenfreada demagogia" as críticas de Allende aos Estados Unidos sobre a Guerra do Vietnã.
O embaixador especula sobre a possibilidade de a esquerda "apelar para via armada a fim de manter o processo de socialização no Chile". Os informes ao longo do ano descrevem atentados às representações de países comunistas e conflitos nas ruas da Capital. "Enfim, a série de ocorrências verificadas nos dois últimos dias me levam a acreditar que, dentro de em breve, o caos assenhorar-se-á do país", alertou o diplomata.
A maioria dos telegramas entre os dias 8 e 13 de setembro de 1973 é classificada e indisponível para consulta. Esses documentos provavelmente revelam os bastidores da decisão brasileira de assistir à posse do governo oriundo do golpe — Câmara Canto foi o único embaixador presente. O próprio Pinochet declarou-se surpreso com a rapidez do reconhecimento brasileiro, somente dois dias após a morte de Allende.
No dia 13, o Itamaraty confirma o envio a Santiago, por via aérea, de 3 mil quilos de medicamentos e 14,4 mil quilos de alimentos. O documento detalha o envio de arroz, açúcar, azeite, leite em pó e café, além de plasma sanguíneo, antibióticos, algodão, ataduras e rolo de raio-X.
Em informe de 17 de setembro, Câmara Canto reconhece que há indefinição sobre a devolução do poder aos civis. Ele considera temerosa a possibilidade de eleições, já que as esquerdas poderiam vencer outra vez.
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