Professor ontem e hoje
Por Juremir Machado da Silva
Dia do professor. Eu sou um deles. Professor universitário. Adoro o que faço. Fico impressionado com a renovação de nossas energias. A cada semestre, tudo recomeça. Patinamos um pouco. E lá vamos nós. Depois de algum tempo de férias, bate a saudade dos alunos, das aulas, da rotina escolar.
Há muitos mitos em torno da vida de professor.
É certo que ser professor de universidade e ser professor de ensino fundamental ou médio, principalmente em certos lugares, é muito diferente.
O primeiro mito é que os alunos de antes eram melhores.
Em quê?
Em alguns matérias, com certeza. Em latim? Em cultura geral? O aluno de hoje tem acesso a uma carga de informações jamais vista. Em 1980, uns dez por cento dos alunos chegavam a curso de jornalismo falando inglês. Essa proporção hoje é muito maior. Durante muito tempo, a universidade esteve restrita às elites. Havia um saber padrão trazido de casa. Hoje o ensino está mais democrático. Isso abre espaço para alunos com formação de base mais deficiente. Em contrapartida, as tecnologias da informação despejam todo tipo de conteúdo em cima de todos e suprem lacunas como nunca antes.
Mudaram os métodos e certos conteúdos. O que se precisa saber?
O ensino de antigamente era baseado na decoreba.
Inteligente era quem tinha uma excelente memória.
Quem falava três línguas era considerado gênio.
Quem sabia a lista dos imperadores romanos era um “cabeção”.
Não funciona mais assim. A memória artificial acabou com a importância da memória natural. Importante é ter boa cultura e saber procurar.
Outro mito se refere à suposta falta de respeito dos alunos.
No popular, aluno bate em professor.
Antigamente professor batia em aluno.
A sala de aula era o reduto de um mestre autoritário, despótico, ditador, um tirano que punia com palmatória e, depois dela, com castigos e humilhações: colocava atrás da porta, de joelhos, em cima do grão de milho, expulsava da sala de aula, usava palavras duras, insultava, berrava, pisoteava.
Eu vi isso em sala de aula. Eu fui para trás da porta. Eu vi meus colegas de joelhos no canto da sala. Eu vi um colega no grão de milho. Eu vi um aluno com chapéu de burro. Na semana da pátria, aluno desfilava como soldado. Não podia errar o passo. Marchava como um soldadinho da ditadura.
O aluno era adestrado por professores tirânicos.
Exagero? Foi na pré-história? Não. Há menos de 50 anos quase tudo isso ainda existia. O professor não podia ser questionado. É possível que, em certas situações atuais, o aluno não possa ser questionado e humilhe o professor.
Estamos em busca do equilíbrio.
Na minha experiência de professor só tenho encontrado alegria: alunos carinhosos, afetivos, gentis, inteligentes, questionadores e amigos.
Sempre pode ter algum diferente. São jovens, na flor da idade, cheios de energias, de dúvidas, de tantas coisas para ver e fazer. Eu os entendo.
O mundo mudou.
O professor de antigamente não era um tirano por querer. Refletia o seu tempo. A família também era assim. O pai era o chefe autoritário da família. Articulava carinho com despotismo. Impunha-se como um rei furioso.
Eu vi um pai obrigar o namorado a casar com a sua filha, com um revólver na cabeça do rapaz, por ter descoberto que eles andavam tendo relações sexuais.
Muitos sentem saudades desse tempo idílico do autoritarismo e de violência. É mais difícil ser pai e professor nestes tempos atuais de negociação e de limites à autoridade. O respeito agora deve ser recíproco. O diálogo se impõe.
Um professor hoje só se faz respeitar pela competência, pela capacidade de dialogar, pela arte de transmitir saber e por ser capaz de ouvir e discutir.
Pela disciplina autoritária ninguém mais se faz admirar ou respeitar.
Só vale a hierarquia do convencimento, do envolvimento, da competência.
Aprender não é sofrer. É sentir prazer. Nem tudo pode ser divertido. Mas nada precisa ser feito na base dos castigo e das reprimendas raivosas.
Impor limites é, antes de tudo, limitar o poder da disciplina arbitrária.
Ser professor é maravilhoso. Um desafio que se renova com o tempo.
Nossas escolas foram durante a maior do tempo excludentes. Só agora os não brancos começam a entrar realmente em certos cursos antes reservados, sob a suposta cobertura do mérito, para os filhos dos donos do poder. Era a reprodução da desigualdade por meio da meritocracia dissimulada. Não havia igualdade de preparação. Em consequência, não havia igualdade de disputa.
E, grosso modo, ainda não há.
Mas uma fresta se abriu com as cotas.
O mundo universitário está ficando mais colorido.
O universo escolar está mais complexo.
Só os simplistas juram que o passado era melhor.
Melhor para quem?
O melhor presente para os heroicos professores é salário melhor.
Quem diz que o salário não é o principal, manipula, mente, falseia. O professor é tudo. É a base de todas as outras profissões baseadas em educação formal. Os salários no ensino fundamental e médio continuam ínfimos.
Não dá para pagar mais?
Dá. Mas para isso a sociedade precisa redefinir as suas prioridades.
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