quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Espaço regional

Talibanização pilchada

O verdadeiro gaúcho: Lanceiro negro

Por Tau Golin
Periodicamente, em setembro, a cidadania republicana é ameaçada por algumas cargas da arrogância metegista. Neste ano, por exemplo, entre todas as imposturas, o MTG pressionou as prefeituras para adotar o seu projeto de educação tradicionalista nas escolas. Ouvi, por exemplo, que o prefeito de Passo Fundo anda com o pala em tiras, em razão das investidas da patrona da 7ª Região Tradicionalista. No passado, em uma sesteada da Câmara de Vereadores, sem que se fizesse a discussão sobre o capital simbólico do município com toda a representação cultural e intelectual, foi aprovada a lei  municipal  2.830/1992. De inspiração nazi-fascista, simplesmente obriga a prática e a doutrinação tradicionalista na rede de ensino municipal. Se fosse o estudo do tradicionalismo não teria problema. Isto é feito na Universidade, por exemplo. Seria apenas mais um objeto, o esforço educativo para compreender um fenômeno associativo-cultural.
Mas a lei e a patrona querem que os tradicionalistas ocupem as Escolas e transformem os alunos em gadinho alienado, ungidos pela aguilhada da padronização, fiquem pequenos talibazinhos pilchados pelos dogmas da visão particular sobre a história do MTG, sobre a sua prática de cultura e, pior, que se convertam em gurizada autômata da celebração do calendário cívico-pilchado que consagraram.
Nesta violação pedagógica, o MTG quer implantar a ferro “o Programa Permanente de Fomento a Tradição e Folclore junto à Secretaria Municipal de Educação”, através de um sistema de adestramento, que tem “o objetivo de despertar nos alunos o gosto pelo folclore, conhecendo, valorizando e vivenciando o folclore rio-grandense, nas diversas manifestações.” Aqui, os termos “tradição” e “folclore” são táticas ilusionistas para a implantação da visão particularizada do tradicionalismo. Aparentemente é algo puro, bucólico, terrunho, já que pretende mesmo, conforme seu Art. 2º, é ocupar “todas as escolas municipais, através de atividades extracurriculares”, preenchendo o tempo dos alunos com “danças folclóricas”, desde que chanceladas pelo MTG, o “fandango gaúcho, interpretação de poesias e de declamações; iniciação ao movimento tradicionalista gaúcho (sic!) com embasamento literário; formação de invernadas artísticas e concursos anuais com premiação.” Tal pedagogia é claríssima. Doutrinar e, depois, premiar, a recompensa para quem seguir as regrinhas determinadas de fora, em que o aluno abdique de escolhas, pois (Art. 3º) “o programa será acompanhado sistematicamente visando avaliar o crescimento cultural do alunado.”
Escola é lugar para estudar e compreender. É o espaço público, laico e republicano. Celebração e culto dogmático e particularizante é em CTG e igreja. A escola é lugar de ilustração. À catequese, prevê o contrato constitucional, reserva-se os ambientes “particulares” de fé. Escola tem uma função educacional, não é a casa da mãe-joana para ser retalhada e invadida pelas “forças” sociais. A educação tem princípios emanados no esclarecimento.
Na última década, historiadores, jornalistas, educadores, tem procurado fortalecer os princípios republicanos, a laicidade brasileira. Identificado o ódio elevado como imanência dos credos, dos dogmatismos. Consubstanciam a intolerância que periga sobre a nação multicultural enraizada no Brasil.
São por fatos cotidianos como a investida da patrona nas instituições públicas, calcando a lança da ignorância no peito do prefeito, que o tradicionalismo é identificado como exemplo antirrepublicano, arrogante, uma instituição particular que tem a ambição de ser “modelo a toda terra”. Que não perde tempo e manipular as leis em seu proveito…
Manifesto contra o tradicionalismo, expressão de centenas de pessoas indignadas contra as usurpações metegistas, disponível na internet, já esclareceu suficientemente que o MTG é uma entidade privada que pretende se consagrar como “cultura oficial”, invadiu instituições, domina espaços do Estado-governo e possui reservas vitalícias nos órgãos públicos. Além disso, arrecada considerável verba que pertence à poupança do povo, para os seus eventos. Invadiu a escola para converter os alunos ao seu culto, quando a educação republicanamente é o espaço do saber, do estudo.
Mais que justificadamente, os signatários do Manifesto postulam por uma CPI na Assembleia Legislativa. O MTG é uma espécie de TFP tolerada, camuflado na ilusão da identidade gauchesca. Urge que se realizem audiências públicas no Conselho de Educação, para discutir pedagogicamente a ameaça à escola pública provocada pelo cetegismo, que conta com a militância de diretoras-prendas nos planos de ensino e a patronagem sobre os professores, com o desejo de transformá-los em preposto de CTG. Também no Conselho de Cultura são aprovados inúmeros projetos de lazer e turismo tradicionalista para captação de verbas pela LIC. Além da usurpação direta, o MTG tem diversos subterfúgios para sua arreada das verbas e espaços públicos.
Em Passo Fundo também está na hora de auferir a usurpação do público pelo MTG.
Por essas questões, o Manifesto é, em seu conjunto, a defesa da cidadania, da democracia, das relações republicanas e da liberdade cultural. No extremo, representa um movimento da ilustração contra o fundamentalismo. Sua intenção é não deixar que um movimento de caráter privado usurpe as esferas públicas e atropele o civismo, ocupe o imaginário e substitua as identidades pelo “tipo gauchesco clubístico citadino” e o “legitime” como modelo regional hierarquicamente superior às contribuições das demais etnias. Principalmente em Passo Fundo, de gentílico caboclo, onde nunca existiu historicamente o grupo social gaúcho.
É neste contexto que o Manifesto, de certa forma, é sucedâneo a uma enorme literatura e posturas públicas já conhecidas, e que vem conseguindo fortalecer as particularidades culturais inter-regionais, demonstrando que o MTG é um movimento militante ideológico-cultural, cada vez mais fundamentalista e intolerante, que procura converter-se em um poder dentro do Estado, invariavelmente pressionando, quando não elegendo governantes sem universalidade.
Muitas pessoas já se deram conta isso. Quase todas têm uma experiência para relatar. O próprio gauchismo tem procurado formas alternativas de associação, sem a necessidade de reproduzir a estrutura da estância escravocrata. Reúnem-se em piquetes, em centros de cultura gaúcha, em ciclos, em grupos etc. Cada vez é mais forte a percepção que tradicionalista não significa necessariamente gaúcho; e, muito menos, rio-grandense. Particularmente, em Passo Fundo, é uma invenção imitativa, aparentemente bucólica, mas que se transformou neste perigo agauchador de indivíduos artificiais, clubísticos, que se reinventam pelas técnicas da pós-modernidade, onde o parecer-ser imagético sufoca a tradição, o folclore e a cultura popular.
Os CTGs transformaram-se nas piras imoladoras dos avós. Exterminadores de memórias, de práticas humanas e reais dos antepassados, inclusive dos tradicionalistas. Onde o caboclo? Onde o mestiço? Onde povoadores? Onde os bravos pioneiros? Onde os conflitos, os direitos e disputas, na formação social do Planalto Médio? Tudo sucumbe e se perde neste pucherão acéfalo do civismo metegista. Ninguém mais tem passado real. A identidade é uma escolha na cartilha do MTG. A vida é substituída pela forja do CTG.
Distantes do mundo real da campanha, nas regiões de hábitos autênticos do povo concreto, mestiço, caboclo, interétnico etc., onde se encontra o capital simbólico, há um sentimento (e muitos o verbalizam) de que o tradicionalista, ao menos estilisticamente, é a carnavalização do gauchismo. Tem forte componente da indústria cultural, não necessita da experiência da territorialidade. Ele é uma agremiação estilística que, no seu limite, chega ao fundamentalismo. Escreveu alguns manuais encíclicos e pretende convertê-los em práticas litúrgicas da sociedade. Em seu fanatismo, brande sua projeção ilusória sobre o mundo, peita prefeitos, condena a imolação secretários independentes e que não rezam pelas suas cartilhas.
Nessa imanência da arrogância, atropela a ordem republicana, e pretende cetegizar o ensino e a sociedade.
Abaixo a talibanização pilchada dos estudantes!

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