quinta-feira, 4 de julho de 2013

Golpe de estado?

Egito: foi 'golpe de estado' ou não?

Soldados egípcios próximos a um veículo blindado no caminho da Universidade do Cairo, onde a Irmandade Muçulmana e o presidente Morsi estariam (AFP)
Influência dos militares na política egípcia não vai desaparecer tão cedo
Quando um golpe de estado não é um golpe? Ou, perguntando de outra forma: existe algo como um "um bom golpe", o que significaria que também deve haver algo como um "mau golpe"?
Se isto existir, onde fica nesta escala a derrubada do presidente egípcio Mohammed Morsi pelo Exército do país?
O fato é que encontrar as respostas a essas perguntas importa pouco.
Os outros países não podem fazer muita coisa a respeito das mudanças no Egito. Nem mesmo os Estados Unidos, com suas tão apregoadas boas relações com os militares egípcios.
E, em uma região problemática como o Oriente Médio, ninguém pode se dar ao luxo de manter uma certa distância do Egito, mesmo se quisessem.
A conversa sobre Washington questionando o apoio financeiro americano ao Egito, e particularmente aos seus militares, é apenas isto: conversa.
Então, em um nível, a discussão se "foi golpe ou não foi golpe" é, como descreveu um conhecedor da situação egípcia, uma questão que só deve preocupar os analistas ocidentais.
Cautela
Mas, analisando por outro prisma muito importante, esta questão importa, sim.
Ela deu o tom das respostas iniciais de governos-chave ocidentais. Como o presidente americano Barack Obama, por exemplo, ao dizer que os Estados Unidos estavam "profundamente preocupados" pelas ações das Forças Armadas Egípcias.
General Sisi e presidente Morsi (Reuters)
O general Sisi anunciou a queda do presidente Morsi (direita)
O que os governos dos outros países disseram sobre a queda de Morsi será lembrado pelo povo egípcio, e a política americana às vésperas da tomada de poder pelos militares gerou muitas críticas tanto dos partidários de Morsi como de opositores do presidente deposto.
Este tom de contida reprimenda também marcou as declarações britânicas, apesar de o ministro do Exterior, William Hague, ter ido ao cerne do problema quando destacou a natureza dupla dos últimos eventos.
Foi, segundo ele, uma "intervenção militar em um sistema democrático", disse, mas também foi, igualmente, uma "intervenção popular".
Pragmatismo e realismo
Então, colocando estes dois aspectos juntos, a derrubada de Morsi se transforma em um "bom golpe"? A opinião mais pragmática seria a de que é preciso esperar para ver o que vai acontecer e também seria bom acrescentar uma boa dose de realismo.
Os militares egípcios tiveram um papel central na política do país antes da saída do presidente Hosni Mubarak, se mantiveram no centro das atenções depois dos levantes da Primavera Árabe e, nesta última crise, saíram dos quartéis para impor o que acreditavam ser o interesse nacional.
A influência dos militares na política egípcia não vai desaparecer tão cedo. Basta lembrar quanto tempo foi necessário para que os militares turcos fossem colocados à margem da política daquele país.
Um presidente eleito democraticamente com certeza foi removido do gabinete pelos militares e isto, na definição de qualquer um, soa como um golpe de estado.
Mas, apenas uma eleição - não importa a vontade popular de fazer uma mudança - não fez uma democracia no Egito.
Militar egípcio (Reuters)
Foi um golpe atípico em democracia imperfeita
Foi, como em tantos outros países da região: o Egito se encontrava em uma jornada para a democracia, estava estabelecendo novos papeis para instituições importantes, criando os órgãos representativos da sociedade civil e, acima de tudo, o povo e os líderes políticos estavam aprendendo a se habituar com essa nova realidade.
Alguns analistas dizem que foi precisamente pelo fato de não ter absorvido suficientemente os hábitos democráticos que Morsi se viu desafiado nas ruas do país.
Por este raciocínio, este foi um golpe atípico em uma democracia muito imperfeita.
Se foi certo ou errado, é uma questão para os especialistas. Os governos da região e os diplomatas no mundo todo terão que lidar com a realidade de um novo Egito.
Dúvidas
Agora tudo depende da transição para uma ordem democrática renovada.
Líderes ocidentais deixaram claro que esta transição precisa ser rápida, transparente e inclusiva.
Mas, grandes dúvidas ainda permanecem.
Como a Irmandade Muçulmana de Morsi será representada nas novas instituições? Quanto apoio popular terá?
E, mais importante, que mensagem esta experiência egípcia envia para grupos parecidos na região?
Eles poderão concluir que seria bom incrementar suas credenciais democráticas. Ou, pelo outro lado, decidir que, depois de vencer uma eleição no Egito, eles simplesmente tiveram o poder roubado de suas mãos - pondo em dúvida, assim, todo o seu esforço e comprometimento com o processo democracia.

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